domingo, 8 de maio de 2016

Garrincha, a estrela não tão solitária ao lado da Elza

Elza e Garrincha na década de 1960 (fonte: http://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,fotos-historicas-garrincha-e-elza-soares,11740,0.htm)

A relação entre música e futebol tem como mais representativo ícone a história entre Garrincha e Elza Soares entre os anos 1960 e 1970.

Após se conhecerem no final de 1961 em um evento para impulsionar a eleição do Garrincha como “Jogador Mais Popular do Rio”, em 1962 se apaixonaram e iniciaram um caloroso relacionamento. Naquela época, ambos estavam em carreira ascendente: enquanto Elza Soares despontava como artista de primeira grandeza da música nacional, escalada para representar o Brasil em um evento cultural que ocorreria no Chile paralelamente à realização da Copa do Mundo, Garrincha alcançava o auge da sua carreira: bicampeão mundial pela seleção brasileira sendo eleito o craque da Copa, campeão carioca e campeão do Torneio Rio-São Paulo pelo Botafogo.

Mas mesmo com altos e baixos, essa relação foi ficando cada vez mais intensa e até mesmo as carreiras do futebolista e da cantora passaram a se misturar. Fonte de inspiração de diversas canções, desde o início da carreira como uma marchinha gravada por Angelita Martinez em 1959, até a sua decadência, como a "Balada nº 7" do Moacir Franco, Garrincha chegou a compor dois sambas gravados pela Elza Soares. Um deles foi “Receita de Balanço”: Vamos balançar, cantando...vamos balançar, sambando..Vamos balançar, e deixando a tristeza da vida pra lá”. O outros foi “Pé Redondo”, esta incluída no disco “Um Show de Elza”, gravado em 1965.

Além disso, Garrincha serviu de inspiração para inúmeras canções após o término de sua carreira, como a clássica “Futebol", do Chico Buarque, de 1989.

Entretanto, o relacionamento entre Garrincha e Elza Soares não era bem visto por uma sociedade machista e a barra pesava principalmente sobre a cantora. Por um lado, era criticada pelos eternos falsos moralistas de plantão como se fosse a responsável pelo fim do casamento já fracassado de Garrincha com Nair. Por outro lado, os amigos do craque também passaram a torcer o nariz para aquela relação já que ela, ciente de que o maior adversário do Mane era o alcoolismo, chegava a procura-lo de boteco em boteco para trazê-lo de volta, tentando impedir que ele caísse na tentação de beber.

Com isso, a guerreira Elza, acostumada com a vida dura desde que nasceu enfrentou mais essa barra em sua vida e mesmo enfrentando problemas no relacionamento com o craque já consumido pelo alcoolismo, não se furtou a tentar de tudo para recuperar o craque quando se aproximava o final da carreira, chegando a leva-lo para a Itália em 1970 para tentar afastá-lo das bebidas enquanto tocava sua carreira na Europa, afastando-se do Brasil na época em que a ditadura apertava o cerco por aqui, perseguindo inclusive vários artistas.

E foi essa garra incrível que pude presenciar no show que ela deu na última sexta-feira, dia 6 de maio, no Teatro Guaíra em Curitiba. Cantando principalmente o intenso repertório de inéditas do disco “Mulher do Fim do Mundo”, Elza mostrou que é uma artista que sabe se reinventar a cada ciclo, interpretando músicas que tratam de assuntos como violência contra a mulher, racismo, preconceitos contra população de periferia entre outros.
Elza Soares no show "Mulher do Fim do Mundo" (foto minha)

E para finalizar o show (e o disco), ela, que enfrentou mortes trágicas de seus filhos (incluindo o único que teve com o Garrincha), homenageia a própria mãe, que faleceu em acidente de carro quando o seu companheiro-craque dirigia alcoolizado, na belíssima canção “Comigo”, de Rômulo Fróes e Alberto Tassinari, cantada à capela após uma sequência de sons distorcidos ( https://www.youtube.com/watch?v=k3CGdu_Dijw )

“Levo minha mãe comigo
embora já se tenha ido
Levo minha mãe comigo
talvez por sermos tão parecidos
Levo minha mãe comigo
de um modo que não sei dizer
Levo minha mãe comigo
pois deu-me seu próprio ser


Que a garra dessa cantora incrível sirva de exemplo a todos! E de quebra ainda homenageia as mães guerreiras desse país. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário