sábado, 26 de julho de 2014

Rubem Alves e a lógica do desenho animado no futebol


É sabido que Rubem Alves não sabia nada de futebol, não jogava, não torcia e tampouco conhecia algum jogador (exceto o Ronaldinho Gaúcho, por quem torcia devido à alegria que transmite enquanto joga). Entretanto, provocado por sua editora, em 2006 resolveu escrever um livro que tem esse esporte apaixonante como tema central: O Futebol levado ao Riso.

Trata-se, como ele mesmo definiu, de uma brincadeira, em que aborda de uma forma leve e pessoal a relação do futebol com diversos temas como religião, infância, guerra, matemática, e principalmente...torcida.

E através de seu afastamento em relação ao futebol conseguiu dar pistas interessantes das razões que o levaram a ser tão apaixonante quanto é.

“O futebol é o circo do mundo. Não há nenhum outro esporte que provoque tanta paixão, tanta alegria, tanta tristeza. O futebol dá sentido à vida de milhões de pessoas que, de outra forma, estariam condenadas ao tédio. É o assunto, nas manhãs de segunda-feira, em bares, escritórios, fábricas, taxis, construções. O futebol é a bola que se joga no jogo das conversas. Faz esquecer lealdades políticas, ideológicas, religiosas, econômicas, raciais. É a grande religião ecumênica. Acabam as diferenças. Todos são iguais. São torcedores de futebol. No mundo inteiro.” (ALVES, 2006, p. 7)

Para Rubem Alves, tal como as pessoas se ligam a uma religião, o que faz escolher determinado time não seriam razões intelectuais ou racionais, mas sim meramente afetivas ligadas a uma experiência social de pertencer a um coletivo. Refletindo sobre a natureza do torcedorm conclui que “o torcedor não se apaixona pelo time. Eles se apaixona pela torcida do time. O time só é o cabide onde a torcida está dependurada”. (ALVES, 2006, p. 26).

A torcida pode chegar à apoteose com a conquista de um título, mas o que mantém seu interesse pelo futebol é a renovação constante, o fato de “passada a euforia da vitória todos os times voltam à estaca zero, porque o futebol não leva a lugar algum” (p.30). Gostamos de ver o adversário derrotado, mas para isso, é preciso que esse mesmo adversário renasça também. Rubem Alves utiliza-se da comparação com a lógica reinante de desenhos animados como Tom e Jerry:

A gente sabe que, depois de se partir em mil cacos, o Tom vai reaparecer, na cena seguinte, forte e mau como sempre, sem apresentar quaisquer sinais do sucedido anteriormente. E depois de ser reduzido à condição de caranguejo ou de panqueca, ele vai estar logo em ação de novo, pois, caso contrário o desenho acabaria.
Pensei, então, que a gente dá risada quando o vilão se ferra, mas não de forma definitiva. Ele se recupera sempre para ser ferrado de novo e de novas formas, para que o riso se repita.” (ALVES, 2006, p. 34).

E até para esse momento de ressaca após uma bela Copa em casa, aliada à contundente derrota frente à Alemanha, Rubem Alves trouxe importante colaboração no capítulo que relaciona futebol ao sadismo:

No final todos os Tons ressuscitarão. Ressuscitarão, belos e lampeiros, em seus uniformes brilhantes, na próxima Copa, como se nada tivesse acontecido. Tudo é desenho animado” (ALVES, 2006, p . 23).


Mesmo sem entender ou até mesmo se envolver com futebol, o legado de Rubem Alves também ficou para os amantes deste esporte, lembrando que uma das suas graças é justamente a sua efemeridade, a sua constante renovação...tal como a vida.  Que venha a próxima Copa!

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