terça-feira, 27 de maio de 2014

Suíça, de chocolates e contradições

Rappan (técnico da Seleção Suíça entre os anos 30 e 60) 

Um dos principais países responsáveis pela difusão do futebol na Europa continental no início do século XX (fundaram, por exemplo, a Internazionale de Milão), os suíços estão entre os fundadores da Fifa em 1904, cuja sede fica em Zurique. Como se não bastasse, o atual presidente da Fifa, Joseph Blatter, é suíço. Entretanto, tal importância fora das quatro linhas não se reflete dentro de campo, cujos resultados estão bem abaixo do que se poderia esperar de um país com tamanha importância política no futebol.

Chegando a sua 10ª Copa, até hoje seu maior legado não foi nenhuma grande conquista ou craques memoráveis, mas sim a introdução da tática defensivista conhecida como “Ferrolho Suíço”.

Diria o filósofo  suíço Jean Jacques Rosseau em O Contrato Social: “o homem nasce livre e em toda parte encontra-se sob ferros”[1]. Talvez esse pensamento tenha servido de inspiração para Karl Rappan, técnico austríaco que dirigiu a Suíça nas Copas de 1938, 54 e 62, considerado o pai do “ferrolho suíço”. A tática consistia em concentrar jogadores no campo de defesa na tentativa de impedir o adversário de chegar ao gol, deixando apenas de um a três jogadores do meio pra frente para eventuais contra-ataques. Esse esquema foi a forma encontrada pelo técnico para poder enfrentar seleções tecnicamente mais fortes. Jogando assim, sua seleção conseguiu alguns resultados expressivos, como eliminar a forte seleção da Alemanha da Copa de 1938.

A identidade da seleção suíça com esse esquema foi tamanha que, mesmo quando o treinador era outro, o esquema adotado manteve-se o mesmo. Foi assim que, em 1950, quando dirigida por Franco Andreoli, empatou com o Brasil na primeira fase da Copa do Mundo (2 x 2 no Pacaembu),  e também entre as Copas de 2006 e 2010 quando estabeleceu o recorde de 551 minutos sem tomar gols. Atualmente é a seleção responsável pela última derrota do Brasil. Veja o gol aqui:

Na Copa de 2006, “conseguiu” a proeza de ser eliminada nas oitavas sem tomar um gol sequer em quatro jogos (a eliminação veio com a derrota na disputa por pênaltis contra Ucrânia após empate sem gols).  Na última edição da Copa do Mundo, se por um lado conseguiu vencer a Espanha (que viria a sagrar-se campeã) por 1 x 0 na primeira rodada, por outro lado não conseguiu sair do 0 x 0 contra a Honduras na última rodada da 1ª fase e acabou eliminada.

Considerando que esse esquema defensivista passou a fazer parte da identidade da seleção suíça, seria certo supor que seus jogos sempre terminassem com poucos gols, certo?

Errado. Assim como a seleção atual da Suíça é repleta de estrangeiro (oito dos 11 titulares são imigrantes) e mesmo assim a sua população votou pela restrição a imigração em fevereiro deste ano, dentro de campo historicamente também encontramos contradições semelhantes:  na história das Copas, o jogo com maior número de gols foi justamente quando esta seleção enfrentou a Áustria e perdeu de 7 x 5 (ainda teve um pênalti perdido) em 1954, justamente na Copa disputada em casa, que aliás alcançou a incrível média de 5,4 gols por partida. Vale a pena conferir os gols deste jogo:

Ou seja, além de contribuir para um jogo específico repleto de gols, o belo território suíço acabou servindo de palco para um verdadeiro festival de gols. Um espetáculo não aos ouvidos, mas principalmente aos olhos dos espectadores. 


[1] ROSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social.

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